quarta-feira, 10 de junho de 2009

Pessoas Pinturas

O seguinte texto fala daquilo que eu tenho dito, neste blogue, acerca do carácter das pessoas. É um texto que escrevi já há algum tempo, mas que resume esta questão da falsidade de certas pessoas.

Acordo.
As pessoas são pinturas que elas próprias pintam.
Fazem-se de muito prestáveis, sempre preocupadas com o próximo, cheias de palavras lindas, sorrisos e abraços…
“Podes contar comigo sempre, sou teu amigo.” Amigo? Claro, amigo de toda a gente!
Convêm agradar a todos ou à maioria. Assim, tens o lugar garantido na rádio, na TV, nas galerias… ou as eleições ganhas, ou o filme patrocinado, ou desconto no arranjo do carro… Por isso, pintam sobre a tela já pintada.
Volto-me na cama
Aproximamo-nos delas. Vemos-lhe os defeitos disfarçados por várias pinceladas impressionistas que nos encantaram. Assustam-se. Fogem. Desaparecem dias, meses…anos.
Quando menos esperamos, quando menos precisamos… quando começamos a tentar esquecê-las, quando a tinta desbota, elas reaparecem. Reaparecem deitando culpa à luz, à humidade… Dão como desculpa o trabalho, a falta de tempo, um familiar doente, a perda do nosso contacto.
“Podes contar comigo sempre se eu precisar, sou teu amigo.”
Pedem-nos, imploram-nos para restaurar a pintura. Aceitámos, damos-lhes outra oportunidade… Afinal, és “meu amigo”.
Passa-se horas nos laboratórios a tentar restaurar algo. Algo que uma radiografia revela ser falso.
Por mais tentativas que se faça, sabe-se que mais dia, menos dia, a tinta torna a desbotar-se.
Saímos de laboratório e anunciamos que detectamos x quadros falsos durante o restauro. Falsos.
Uns entram desesperados pelo laboratório dentro. Agarram-se às suas pinturas.
“Não, não se pode difamar assim uma pessoa!”
Não vou dizer nada… porque afinal dizes-te “meu amigo”.
Outros esperam tranquilos.
Não vou dizer nada…
Só lamento o tempo que gastei a restaurar o que se vai desbotar novamente, porque é falso. Falso.
Ou nem isso lamento.
Volto-me outra vez.
Sinto desprezo por aquelas pinturas…
Não, nem isso sinto.
Simplesmente esqueço-as, não existem, nunca existiram…
Ou existem, só que eu já não tenho laboratório, nem pinturas para restaurar.
Adormeço.

Rita Silva
02/09/2005

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